terça-feira, 23 de agosto de 2011

Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade


Parte I

Tania Zagury
Distúrbio que vem preocupando pais e professores nas ultimas décadas, o Transtorno do Déficit de Atenção / Hiperatividade (TDAH) tem recebido diferentes denominações a partir, principal­mente, de 1902: Disfunção Cerebral Mínima, Reação Hipercinética da Infância, Distúrbio do Déficit de Atenção, até a atual nomenclatura, utilizada no Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais, da Associação Ame­ricana de Psiquiatria.
O TDAH costuma aparecer ainda na primeira infância, em geral antes dos sete anos. É um distúrbio crônico, e, para efeito de diagnóstico, as características que serão em seguida apresentadas precisam ser constantes, nunca comportamentos ocasionais. Observações com esse propósito, portanto, devem ser feitas por um período nunca inferior a seis meses, se possível estendo a observação a até um ano aproxi­madamente.
Outro dado importante para efeito de diagnóstico é que o distúrbio revela-se independentemente do ambiente onde a criança esteja, assim como também não depende do tipo de tarefa. Não é um problema de inteligência, como muitos pensam, mas, sim, de execução. Explicando melhor: a criança pode atÉ saber o que deve ser feito, mas parece não conseguir concretizar o objetivo ou pensar antes de agir.
Ainda não se sabe ao certo o que causa o problema, mas estudos recentes levam a supor que um ou vários dos elementos abaixo possam estar presentes no quadro:
  • Hereditariedade (cinco vezes maior em quem tem pais com o transtorno).
  • Problemas durante a gravidez ou no parto.
  • Sofrimento fetal no nascimento.
  • Exposição a substâncias como chumbo e fumo, entre outras.
  • Problemas familiares (discórdia conjugal).
  • Baixa instrução paterna.
  • Funcionamento relacional caótico na família.
  • Presença de apenas um dos genitores.

A prevalência é de 3% a 6% em crianças entre sete e catorze anos, com freqüência um pouco maior nas meninas. Na adolescência, são poucos os dados disponíveis.

É freqüente a co-morbidade, ou seja, em geral o problema se apresenta em conjunto com outros. Cerca de 50% das pessoas afetadas costuma apresentar também problemas de comportamento, como agressividade, tendência a mentir, roubo, oposição, desafio a regras.

Estudos recentes comprovam que 70% das crianças com TDAH mantêm o diagnóstico aos 14 anos, e algumas, por toda a vida. De acordo com o desenvolvimento, os sintomas apresentam diferentes predominâncias. Nos pré-escolares, revelam-se mais como hiperatividade, dificuldades em aceitar limites e tolerar frustrações; na idade escolar, em geral apresenta sintomas combinados, enquanto, na adolescência, tende mais para a impulsividade e desatenção.

Os manuais de psiquiatria apresentam quatro tipos: desatento, imperativo­-impulsivo combinado e não-específico.

Conhecer os sintomas é essen­cial para o diagnóstico e tratamento eficazes. A seguir, apresento os mais freqüentes em cada um dos quatro tipos:

I) Desatento
  • Não presta atenção a detalhes ou comete enganos por descuido.
  • Tem dificuldade de concentração em tarefas e / ou jogos.
  • Tem dificuldade de seguir instruções e ou terminar tarefas.
  • E desorganizado nas tarefas e com os materiais.
  • Evita atividades que exijam esforço mental continuado.
  • Perde objetos necessários às atividades.
  • Distrai-se com facilidade.
  • Esquece tarefas e compromissos diários.

2) Hiperativo-impulsivo
  • Inquieto (remexe pés e mãos quando sentado).
  • Não pára sentado muito tempo.
  • Pula, corre muito e sem destino ("bicho-carpinteiro"). No adulto, manifesta-se por um sentimento geral de inquietação.
  • É muito barulhento.
  • É muito agitado.
  • Fala excessivamente.
  • Responde antes de se terminar de perguntar.
  • Tem dificuldade de esperar sua vez.
  • Intromete-se em conversas e jogos alheios.

3) Combinado
  • Apresenta sintomas de ambos os conjuntos de critérios (parece estar associado a maiores prejuízos globais na vida da criança).

4) Não-específico

  • Características em número insuficiente para um diagnóstico completo. Ainda assim, pode desequilibrar a rotina diária.

O diagnóstico do TDAH é complexo e delicado. É necessário considerar as múltiplas facetas do ser humano: intelectual, acadêmica, social e emocional. Também é essencial saber que outros problemas podem ter sintomas similares como, por exemplo, depressão, delinqüência e impulsividade.

No intuito de evitar enganos - bastante freqüentes, aliás -, é fundamental considerar como mais importante o histórico clínico e do desenvolvimento. O exame médico é essencial ao diagnóstico diferencial. Também é imprescindível conjugar dados fornecidos pelos diversos adultos que convivem com a criança (pro­fessores, pais, parentes, amigos). A presença de, no mínimo, seis sintomas, de forma contínua (nunca ocasio­nal) e pelo menos em dois ambientes diferentes freqüentados pela criança (escola e casa, por exemplo) permite evitar muitos problemas, porque elimina ou minimiza a rotulação inadvertida ou precipitada.

De qualquer forma, o médico ou o psicólogo são os profissionais habilitados a fechar o diagnóstico, enquanto a ação de pais e professores deve se ater à observação sistemática e ao extremamente útil forneci­mento de dados concretos aqueles profissionais. Em outras palavras: pais e professores fazem a suspeita diagnóstica e, como já dissemos, a observação deve ser feita por um período de, no mínimo, seis meses consecutivos. Fica o alerta, porem, de que a diferenciação é difícil e deve ser sempre cautelosa; confunde-se bastante, atualmente, a criança ativa, saudavelmente ativa, com a portado­ra do TDAH. Após a observação - caso a suspeita persista - a criança deve ser encaminhada a um médico (psiquiatra ou neurologista), que de posse das informações da escola e da família, fará o diagnóstico diferencial.

Com relação ao tratamento, o grande progresso é o reconhecimento da necessidade da intervenção precoce, bem como a consciência de que, para o êxito, são necessárias intervenções múltiplas. Em outras palavras: o tratamento deverá ser feito por uma equipe composta de vários profissionais. Deve-se também priorizar inicialmente o esclarecimento da família e dos docentes.

O importante é que sejam feitas correções de conceitos e "rótulos"; quer dizer, e preciso que a família e os professores tenham consciência de que o problema é real, não se tratando de preguiça, falta de força de vontade ou de inteligência. Outro aspecto importante é que, através de encontros e troca de informações entre os diversos profissionais envolvidos no tratamento, os pais liberam suas dúvidas e angústias, tornando-­se mais aptos a colaborar de forma pró-ativa.

No próximo artigo, apresentarei uma ficha de acompanhamento para crianças e adolescentes e a forma de utilizá-la, de forma a permitir a observação cuidadosa, que afasta “impressões” e “achismos”, trocando-as por dados concretos.

TDAH - Transtorno do Déficit de Atenção e Hiperatividade 
parte II

No último artigo tratamos do conceito, incidência, características e conseqüências do TDA-H.
Como prometi agora apresento um modelo de ficha (existem vários), a SNAP-lV, construída a partir dos sintomas do Manual de Diagnóstico e Estatística de Transtornos Mentais - IV Edição (DSM-IV) da Associação Americana de Psiquiatria.
Esse modelo pode ser usado para avaliar crianças e adolescentes. Sua tradução foi feita pelo Grupo de Estudos do Déficit de Atenção (Geda) da UFRJ e pelo Serviço de Psiquiatria da Infância e Adolescência da UFRGS.
O uso é fácil - a ficha é auto-explicativa, mas é importante lembrar que a observação deve ser feita pelo menos por alguns meses, em diferentes situações, e em diversas atividades. Assim teremos mais segurança de que o sintoma de fato existe e é constante. Esse cuidado é fundamental para evitar-se encaminhamentos desnecessários. E lembre-se de que o diagnóstico definitivo só pode ser fornecido por um profissional de saúde. Pais e educadores podem ajudar muito, mas o que fazemos é "suspeita diagnóstica e encaminhamento". Façam bom uso!

FICHA DE ACOMPANHAMENTO PARA CRIANÇAS E ADOLESCENTES

         
Para cada item, escolha a coluna que melhor descreve o(a) aluno(a) e
Marque com um X :
Nem um pouco
Um Pouco
Muito




1. Não consegue prestar muita atenção a detalhes ou comete erros por descuido nos trabalhos da escola ou nas tarefas







2. Tem dificuldade de manter a atenção em tarefas ou atividades de lazer.



3. Parece não estar ouvindo quando se fala diretamente com ele(a).



4. Não segue instruções ate o fim e não termina deveres de escola, tarefas ou obrigações.



5. Tem dificuldade para organizar tarefas e atividades.



6. Evita, não gosta ou se envolve contra a vontade em tarefas que exigem esforço mental prolongado.







7. Perde coisas necessárias para atividades (por exemplo: brinquedos, deveres da escola), lápis ou livros).







8. Distrai-se com estímulos externos.



9. Mostra-se esquecido(a) em atividades do dia-a-dia.



10. Mexe com as mãos ou os pés ou se remexe na cadeira.



11. Sai do lugar na sala de aula ou em outras situações em que se espera que fique sentado.



12. Corre de um lado para outro ou sobe demais nas coisas, em situações inapropriadas.



13. Tem dificuldade em brincar ou envolver-se em atividades de lazer de forma calma.



14. Não pára ou freqüentemente está a "mil por hora".



15. Fala em excesso.



16. Responde às perguntas de forma precipitada antes delas terem sido terminadas.



17. Tem dificuldade de esperar sua vez.



18. Interrompe os outros ou se intromete (por exemplo: em conversas ou jogos alheios).



Como avaliar:
1) Se pelo menos seis (6) itens foram marcados como "bastante" ou "demais" dentre os  itens de 1 a 9:
Significa que  existem mais sintomas de desatenção que o esperado numa criança ou num adolescente.

2) Se pelo menos seis (6) itens foram marcados como "bastante" ou "demais" dentre os itens de 10 a 18:
Significa que  existem mais sintomas de hiperatividade e impulsividade que o esperado numa criança ou num adolescente.

O questionário SNAP-IV é útil para avaliar apenas o primeiro dos critérios (Critério A) para se fazer o diagnóstico.

Existem outros critérios que também são necessários considerar.
IMPORTANTE: Não se pode fazer o diagnóstico de TDAH apenas com o Critério A. Use simultaneamente os demais critérios, abaixo relacionados.
Critério A: Sintomas (vistos acima).
Critério B: Alguns desses sintomas devem estar presentes antes dos sete anos de idade.
Critério C: Existem problemas causados pelos sintomas acima em pelo menos dois contextos diferentes (por exemplo: na escola, no trabalho ou na vida social e em casa.
Critério D: Há problemas evidentes na vida escolar, social ou familiar relacionados (por conta dos sintomas).
Critério E: Se existe um outro problema (tal como depressão, deficiência mental, psicose, etc.), os sintomas não podem ser atribuídos exclusivamente ao TDAH.

Nenhum comentário:

Postar um comentário