quarta-feira, 17 de agosto de 2011

Como funciona a inteligência

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                    Vou contar uma historinha acontecida comigo para explicar como funciona a inteligência…
            Eu era um menino de 6 anos. Ainda não estava na escola. Morava numa casa bem pequena, em uma cidade do interior de Minas. A casa vizinha era motivo da minha inveja. Um bosque: cinco laranjeiras, quatro mangueiras, oito jabuticabeiras, um pessegueiro, duas ameixeiras. E, bem próximo do muro, um pé de pitanga. Estava carregado de frutinhas vermelhas. Fiquei com muita vontade de comer as pitangas. Mas elas estavam longe do meu braço.
            Quando o desejo acontece, ele chama a inteligência em seu auxílio, porque a função da inteligência é realizar os desejos. O meu desejo de comer as frutinhas me fez apelar para as minhas inteligências. As inteligências são muitas, como muitas são as ferramentas dentro da caixa. A primeira inteligência que se manifestou foi a inteligência criminosa. E ela me disse: — Pule o muro e roube as pitangas! Mas logo uma outra inteligência, a da prudência, medrosa, me disse: — Não faça isso! Você poderá ser pego e será uma vergonha. Desisti do conselho.
            Aí entrou em cena a inteligência “engenharial” e ela me disse: — Faça uma maquineta de roubar pitangas. Maquineta é um artefato técnico. E eu já disse que todos os artefatos técnicos que os homens inventam são extensões do corpo. Minha maquineta teria de ser uma extensão do meu corpo, dos meus braços e mãos. Peguei um cabo de vassoura, extensão do braço, e uma lata de massa de tomate que amarrei na ponta do cabo da vassoura, extensão da minha mão. Estava pronta a maquineta. Com ela, roubei todas as pitangas que eu queria.

Atenção: Gravar as duas alternativas

Alternativa 1:
            A inteligência, em seu estado normal, está dormindo, flácida, desinteressada. Mas quando o desejo aparece, ela acorda e começa a funcionar. Se não houver o desejo, a inteligência continuará dormindo.
            Por vezes, pensamos que uma pessoa não é inteligente. Mas o que acontece é que sua inteligência ainda não foi despertada pelo desejo.

Alternativa 2:
            Vou usar uma metáfora esquisita. Não se assustem: a inteligência é igual ao pênis. O pênis, em seu estado normal, é um órgão excretor, flácido, que aponta para baixo. Mas se excitado, ele passa por transformações hidráulicas, cresce, aponta para o céu e ganha a possibilidade de ter prazer, de dar prazer e de gerar vida.
            Bem, a inteligência também é assim: é preciso que seja excitada para pensar coisas interessantes.
            Minha inteligência jamais iria funcionar para roubar um tijolo porque eu não queria comer um tijolo. Isso tem a ver com o que eu já disse: que o corpo é o início de tudo. É o corpo que deseja. Deseja acabar com uma dor, deseja ter um prazer.
            Aquilo que o corpo aprende por meio do seu desejo é pensado e aprendido. Não é jamais esquecido. Já aquilo que é imposto sobre o corpo, sem que ele deseje, é logo esquecido.
            Proponho uma brincadeira: o professor chega em classe e anuncia uma prova surpresa. A turma berra. Ele a tranquiliza dizendo que vai ser fácil, sobre conhecimentos velhos. Aí, ele põe no quadro uma prova que deu no ano passado. Qual vai ser o resultado?

Rubem Alves
Psicopedagogo, professor é bacharel e licenciado em Geografia e mestre em Ciências Humanas pela Universidade de São Paulo, especialista em Inteligência e Cognição.

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