Maria Irene Maluf
“PIOR DO QUE NÃO GANHAR É PERDER A OPORTUNIDADE DE APRENDER.” (ANÔNIMO)
É sem duvida uma tarefa difícil, mas indispensável, de responsabilidade da família e da escola, ensinar às crianças que, embora sejam inteligentes e espertas, elas podem e vão necessariamente errar em muitas situações, tanto na escola como na vida. E que cabe aos pais em primeiro lugar e depois à escola, ensiná-las a conviver com normas e a adquirir responsabilidade sobre seus atos. Isso inclui lidar de forma equilibrada e resiliente com as perdas que as experiências do dia a dia impõem a todos nós.
É natural que crianças e jovens cometam muitos equívocos ao lidar com os limites impostos, mas cabe aos seus familiares estarem atentos para intermediar essa aprendizagem, os orientando a enfrentar e responder pelas consequências de seus atos.
Assim como errar não é necessariamente sinônimo de fracassar, mas sim de aprender, refazer e superar, as perdas fazem parte do amadurecimento saudável e constituem um processo que não cessa e quanto mais preparada a criança chegar à adolescência, melhor conseguirá enfrentar os desafios dessa fase.
Por esse motivo é primordial ensiná-las desde cedo a suplantar e conviver com perdas, a se conformar com o inevitável ou o irremediável e ao mesmo tempo motivá-las na busca de soluções que permitiam resolver os problemas e minimizar os prejuízos que estes podem causar. E esse processo de aprendizagem deve ter inicio no lar, quando a criança ainda é bem pequena e começa a perceber que existem regras às quais deve obedecer. E o primeiro sinal de alerta é a palavra “não”, dita por seus pais cada vez que ultrapassar o seu limite.
Houve um tempo no passado em que se temia que as crianças ficassem “traumatizadas” por seguidas frustrações que o “não” lhes traria e se tornassem infelizes e marcadas por um sentimento de incapacidade ou de baixa autoestima. Puro engano: muitas dessas crianças, tratadas como se fossem cristal tornaram-se adolescentes de comportamento inadequado, perigoso, sem limites, jovens permanentemente frustrados por mais que os pais se desdobrassem em lhes satisfazer os desejos. E, quando adultos, mostraram (e mostram) as consequências de sua criação, tornando-se pessoas incapazes de se recuperarem depois de uma simples contrariedade e lidando muito mal com a autoridade, com os valores sociais, com o direito do outro e com suas próprias responsabilidades.
Pior ainda é que tais pessoas não aprendem a aquilatar seus erros e ao se verem diante da maternidade/paternidade, não se mostram aptas a reconhecer seu papel, não se dão conta que os filhos dependem deles e quando não “terceirizam” sua educação, simplesmente criam pequenas réplicas de si mesmos: dizem sempre sim, pois é mais fácil do que dar atenção, supervisionar e conduzir suas crianças, porque não aprenderam a doar, mas apenas a receber. Ou dizem não em um momento e sim logo em seguida, depois que os filhos insistem, perdendo a autoridade e ofertando insegurança.
E pensar que apenas o uso de uma palavra, um não bem aplicado, na hora certa e de maneira firme, pode modificar todo esse quadro... ou melhor ainda, um “vou pensar” para não ter como se arrepender de um momento de impulso, ensinando também a criança que deve esperar a resposta de quem é responsável por ela e a quem ela deve reconhecer como autoridade. E após receber uma negativa a um pedido, mesmo não gostando, aceitar por confiar que foi decidido assim por ser o melhor no momento, e dessa forma desenvolvem a resiliência, tornam-se aptas a enfrentar os desafios da vida adulta, ultrapassando o natural egocentrismo infantil, quando acreditam que o mundo os deve satisfazer rápido e sempre.
Entretanto o que vemos frequentemente hoje, talvez devido à estrutura que a família vem assumindo desde as últimas décadas do século XX, é que muitos pais temem perder o amor dos filhos por lhes negar coisas materiais. Dizer “não” tornou-se algo quase impensável e tomar a defesa do filho em situações em que este está em erro, passou a ser natural... o que é inversão de valores e um passaporte para criar um jovem, no mínimo, inadequado.
Ai começa o problema da escola, uma instituição criada para complementar a educação familiar enquanto forma cidadãos dentro da cultura e dos conhecimentos de sua época. O que fazer quando as famílias se colocam ao lado das fileiras dos alunos e não dos adultos, identificando-se com a imaturidade infantil e juvenil ao invés de ponderar sobre a razão que move comportamentos inadequados nos seus filhos?
Como modificar essa situação não é assunto para um espaço tão pequeno e nem temos a pretensão de o fazer, mas fica aqui registrado um alerta para reflexão de cada família e cada escola, sobre o filho/aluno que deixaremos para o mundo.
Maria Irene Maluf é Pedagoga Especialista em Psicopedagogia e Educação Especial, editora da revista Psicopedagogia da ABPp, Coordenadora do Núcleo Sul e Sudeste do Grupo Saber e coordenadora SP do Curso de Especialização em Neuroaprendizagem – Instituto Saber/FACEPD.
Site: www.irenemaluf.com.br - E-mail: irenemaluf@uol.com.br
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