Nos últimos três anos, a divulgação das médias das escolas no Enem tem sido um dos momentos de maior relevância para a cobertura de educação. No
iG , onde edito o
canal há mais ou menos esse mesmo período, sempre comemoro um pico de audiência, como certamente ocorre em outros veículos, e o prazer de finalmente todo mundo se dar conta de que o que acontece nas salas de aula é tão – ou até mais importante – que o mensalão ou a rodada do campeonato brasileiro. Se o Enem em si (e suas possíveis falhas) é a Copa do Mundo das editorias de educação, a divulgação das notas é o sorteio das chaves.
De um lado, há um grande interesse da sociedade pelas médias. Alunos, pais, professores e gestores anseiam pelo ranking dos colégios, seja para conhecer o desempenho de suas instituições e, quando possível, fazer escolhas, seja para avaliar o trabalho realizado e, quem sabe, faturar com bons resultados. De outro, educadores e especialistas em avaliação escolar chamam a atenção para a importância dos diagnósticos do sistema de ensino como instrumentos para melhorá-lo e não para promover competições entre colégios.
Nas últimas semanas, estive em dois encontros esclarecedores sobre avaliações, nos quais tive a oportunidade de ouvir, conversar e aprender com os profissionais mais competentes e envolvidos com o tema no País sobre aplicação de testes, metodologias usadas e a maneira como contribuem – e poderiam contribuir mais – para o que se diz ser um dos principais anseios do Brasil: educação de qualidade. De todos os recados repassados, o mais repetido é: Não façam rankings (quase acompanhado por um “pelo amor de deus”)!
Sem a devida contextualização, as listas de melhores e piores não são positivas para ninguém, defendem os especialistas. Nem para as escolas que lideram os rankings e acabam transformando o ensino em preparação para testes, nem para as mal colocadas que não entendem a nota e o que deve ser feito para mudá-la.
O próprio ministro da Educação, Aloizio Mercadante, ao divulgar as médias fez a ressalva: "O Enem por escola é insuficiente como instrumento de avaliação do estabelecimento escolar porque há escolas com naturezas muito distintas". Mas não se preocupou em fornecer dados técnicos para traduzir os resultados e muito menos tempo para os jornalistas buscá-los antes de já ser necessário replicá-los.
Ao reproduzir a mesma tabela do MEC, a imprensa passa a ser a vilã divulgadora de rankings, seja por “inabilidade” dos jornalistas seja por “má fé” em busca de audiência. E ela responde imediatamente. No iG, a ferramenta de consulta das notas do Enem foi uma das páginas mais lidas do dia.
Quem está errado? A sociedade que justamente quer saber o desempenho de suas escolas, o MEC que trabalha as informações por mais de um ano (o resultado agora divulgado é referente à prova do ano passado), mas ao torná-las públicas só chama a atenção para aquelas que sustentam suas políticas, ou a imprensa que assume o papel de divulgar essas médias, mas nem sempre é competente no papel de explicá-las?
Provavelmente todos. Perde o Inep, que reconhecidamente é responsável pela evolução das avaliações educacionais no Brasil e vê seu trabalho simplificado e usado para promover grupos educacionais e o próprio governo. Perde também o trabalho jornalístico, que pouco consegue acrescentar ao debate aprofundado sobre educação. E principalmente perde a comunidade, que deixa de ter acesso a um bom instrumento para fazer escolhas, pressionar e promover mudanças.
Por sorte, o sorteio das chaves não define o resultado do torneio e em educação não existe uma final decisiva. Sempre é possível virar o jogo.
*jornalista e editora do canal do Último Segundo
iG Educação